Eleita uma das 20 mulheres mais poderosas do Brasil pela revista Forbes em 2019, Gabriela Manssur tem um sonho ambicioso: salvar todas as mulheres. Ex-promotora de Justiça e candidata a deputada federal pelo MDB nas eleições passadas, ela é fundadora e presidente do Instituto Justiça de Saia, que atua em defesa das vítimas de violência doméstica e facilita a inclusão dessas mulheres no mercado de trabalho.
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Um dos projetos realizados pelo Justiça de Saia é o Justiceiras , que completa três anos de existência nesta sexta-feira (31). O projeto promove orientação jurídica, psicológica, socioassistencial e médica às meninas e mulheres vítimas de violência, por meio de uma rede de apoio e acolhimento gratuito e online. As vítimas podem pedir ajuda pelo site https://justiceiras.org.br/ ou ainda pelo telefone (11) 99639-1212.
O Justiceiras conta com cerca de 15.000 voluntárias, entre advogadas, médicas e psicólogas, que já prestaram atendimento a mais de 13.500 vítimas de violência contra a mulher nestes três anos de existência. “Eu sempre falo que sou um 180 ambulante”, comenta Gabriela em entrevista ao iG Delas .
O projeto foi criado durante a pandemia de Covid-19. Em 2020, a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos recebeu 105.671 denúncias de violência contra a mulher. Impedidas de sair de casa, diante das medidas restritivas para conter a propagação do vírus, as vítimas eram obrigadas a conviver ainda mais tempo com os agressores.
Já no primeiro semestre de 2022, o Brasil bateu recorde de feminicídios, com cerca de 700 casos no período (uma mulher morta a cada seis horas), segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Mulheres negras foram as mais atingidas: elas representam 67% das vítimas de feminicídios e 89% das vítimas de violência sexual.
“O Brasil tem a Lei Maria da Penha, a terceira legislação mais bem avaliada do mundo. Temos boas política públicas, boas legislações, o que precisamos é descaracterizar o machismo na sociedade, educar não apenas as crianças e os jovens, mas também os adultos sobre o panorama da violência”, avalia a advogada.
“As mulheres no Brasil são vistas como propriedade, e essa estrutura incute nas pessoas a falsa premissa de que devemos aceitar as microviolências, porque somos mulheres, devemos falar baixo, ganhar menos etc. Precisamos de muito trabalho para transformar as próximas gerações e impulsionar meninas a ocuparem espaços, e, principalmente, não aceitarem a violência. Fortalecer a autoestima da mulher é o marco para ela não aceitar a violência, seja qual for”, completa.
Na política
Na política, Gabriela Manssur foi idealizadora do projeto de lei ‘Tem Saída’, que regulamentou a Lei Municipal 17.341, por meio do Decreto 59.537, em São Paulo. Trata-se de uma política pública voltada à autonomia financeira e à empregabilidade da mulher em situação de violência doméstica e familiar.
Além disso, co-idealizou a lei ‘Tempo de Despertar’ nos municípios de Taboão da Serra e de São Paulo e no Estado de São Paulo, que dispõe sobre a conscientização e a responsabilização dos autores de violência doméstica. Seu projeto foi utilizado como um dos fundamentos da Lei Federal 13.984/20, que torna obrigatória a ressocialização do agressor.
Ao iG Delas , ela elege o que ainda deve ser feito em termos de políticas públicas para mudar o cenário de violência contra a mulher no Brasil, eleito pelo Mapa da Violência em 2015 o 5º país que mais mata mulheres no mundo: “Aumentar o número de Delegacias da Mulher; colocar uma Casa da Mulher Brasileira em todos os estados; aumentar as penas para crimes contra as mulheres; implementar a perspectiva de gênero em todas as esferas do Estado Brasileiro; e promover orçamento próprio para as pautas femininas”.
“Dentre outras, a prevenção é o nosso grande trunfo para salvar as mulheres brasileiras e a sociedade como um todo. A violência afeta todos nós, tanto em dignidade quanto economicamente”, complementa.
Gabriela também elaborou o pacote anticrime que deu origem ao Pacto pela Implementação de Políticas Públicas de Prevenção e Combate à Violência contra Mulheres. “Para a mulher conseguir deixar o ciclo de violência, ela necessita de apoio psicológico, socioassistencial, emprego, segurança, assistência médica, e não julgamento. Todos esses pilares abrangem vários órgãos públicos que precisam estar prontos quando as mulheres pedirem ajuda”.
No último dia 8 de março, abriu seu próprio escritório de advocacia para mulheres. Além disso, integra o Comitê Nacional He for She, da ONU Mulheres, pensado para promover a equidade de gênero. Questionada se concorda com o título atribuído pela Forbes, a ex-promotora responde: “Se esse título inspira outras mulheres a buscarem equidade, justiça e representatividade, me considero a mulher mais poderosa do mundo!”.
Gabriela Manssur trabalhou como promotora de Justiça entre 2003 e 2022, quando decidiu se afastar do cargo no Ministério Público para concorrer a uma cadeira no Legislativo. À época, a jurista teve um pedido de impugnação apresentado pela Procuradoria Eleitoral Regional de São Paulo no seu processo de registro de candidatura.
De acordo com a procuradoria, ela não havia sido exonerada do MP quando se filiou ao MDB, em 1º de abril de 2022, o que a tornaria inelegível.
“Foi uma decisão muito difícil e num momento de muita pressão. Eu estava me deparando com várias situações acontecendo ao mesmo tempo, mas eu tinha que decidir rápido, então escutei a minha intuição. Embora eu tenha entendido que, na hora, a pressão pela tomada de decisão foi injusta, seguimos! Hoje estou muito realizada, empolgada com a nova trajetória que estou traçando”, afirma.
No Ministério Público, atuou em casos de grande repercussão nacional, como João de Deus, ex-médium acusado por mais de 300 mulheres de abuso sexual, e Saul Klen, filho do fundador das Casas Bahia que acumula acusações de estupro, prostituição e tráfico sexual.
A ex-promotora já sofreu ameaças por causa de sua atuação no combate à violência contra a mulher. Ela diz ser uma mulher corajosa e determinada, mas que, como qualquer outra mãe, filha e irmã, teme pelas pessoas que ama. “O importante é que todas elas sempre me apoiaram no combate à violência contra as mulheres. A minha mãe sempre foi uma fonte de inspiração para eu lutar pelo meu espaço, então mesmo com algum receio, sabia que teria o apoio dos meus familiares”, confessa.
Em setembro do ano passado, quando concorria às eleições, a advogada foi alvo de ciberataques. Além de ameaças direcionadas a ela e à sua equipe, Gabriela teve dados pessoais vazados. “Dá tempo de barrar a intenção dessa ‘vadia’ de entrar para a política”, dizia uma das mensagens. “Eu nunca desisti de apoiar outras mulheres, seja com acolhimento ou assumindo casos emblemáticos de grande risco”, pontua.
Gabriela Manssur acredita que ser mulher é um ato político. Para ela, a política está em tudo. “Eu vou continuar promovendo política para as mulheres até conseguir fazer o Brasil deixar de ser o 5° país que mais mata mulheres no mundo”, finaliza.
Fonte: Mulher