“O cheiro é invisível e intocável, mas é mágico porque é capaz de provocar sensações que influenciam o nosso humor”, afirma Verônica Kato, perfumista da Natura, profissão que ainda é raridade no Brasil. “É por isso que uma memória olfativa pode trazer recordações. Segundo estudos de neurociência, algumas ervas aromáticas, como o alecrim e a hortelã, estimulam a atenção; as notas cítricas energizam e despertam o ânimo; as notas doces saciam e aliviam a ansiedade; e, ainda, as notas frutais transmitem prazer e alegria”.
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Estima-se que sejam usados de 70 a 300 ingredientes para se fazer um perfume. Esses, por sua vez, podem ser de origem natural (flores, frutos, raízes etc) ou sintética. O desenvolvimento de uma fragrância leva, em média, um ano e meio.
O Brasil tem o segundo maior mercado de perfume do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, de acordo com o provedor de pesquisas de mercado Euromonitor International . “Estando aqui no Brasil, que é o país com a maior floresta biodiversa do mundo, a gente pensou: ‘Não é possível que aqui não tenha um cheiro que ninguém nunca sentiu'”, revela Joana Miranda, gerente do núcleo olfativo da Natura.
Ativos da Amazônia
As expedições à Amazônia levaram à descoberta de ingredientes que ainda não haviam sido utilizados na perfumaria mundial, como a Priprioca, o Breu Branco e a Vanilla Bahiana.
“É muito raro ter novos ingredientes aromáticos com poder olfativo inédito. O que normalmente temos são as mesmas espécies com plantio em outras regiões, espécies similares com cheiros similares ao que já existe no mercado ou ingredientes sintéticos”, comenta Denise Coutinho, diretora de marketing.
Os ingredientes (entre manteigas, óleos essenciais, extratos e derivados) são empregados nas fórmulas de hidratantes, produtos para tratamento de cabelos e na perfumaria. “O senso comum é de que o natural é o contrário de tecnologia, e isso não é verdade. Para ter o natural com segurança, você precisa ter toda uma tecnologia envolvida”, diz Iguatemi Costa, líder de Pesquisa Avançada do Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento da Natura.
Empresa recria pele e órgãos humanos em chip para avaliar a segurança dos produtos como alternativa aos testes em animais
No início do mês passado, o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, publicou uma resolução que proíbe testes em animais em pesquisas para desenvolvimento e controle de qualidade de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes. Mas, apesar da proibição bastante recente, a Natura deixou de realizar testes em animais em 2006. Desde 2018, a empresa possui o selo The Leaping Bunny , concedido pela organização Cruelty Free International , uma das mais antigas do mundo na luta pela causa.
A diversidade, contudo, se torna um desafio quando se tem que garantir a segurança das matérias-primas. “Às vezes, são compostos inéditos, para os quais a gente não tem dados na literatura toxicológica e não tem histórico de uso. E a gente tem de garantir a segurança sem fazer testes em animais”, comenta Kelen Fabiola Arroteia, Gerente do Núcleo de Avaliação Pré-Clínica da Natura.
Em parceria com o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), a empresa desenvolveu, em 2019, a metodologia “Human-on-a-chip” , que simula o funcionamento do corpo humano em laboratório. Ela consiste na combinação de três estruturas biológicas equivalentes a órgãos humanos, fabricadas em laboratório e integradas de forma a reproduzir o funcionamento do nosso organismo. Em uma das cavidades, por exemplo, se coloca um fragmento de pele humana, reconstruído a partir de células humanas e impresso em impressora 3D.
O sistema é ligado a uma máquina que injeta uma solução líquida capaz de circular entre as cavidades, — semelhante ao processo de hemodiálise —, imitando o fluxo sanguíneo. Isto permite aos pesquisadores e cientistas avaliarem os efeitos de um ingrediente cosmético tanto dentro (órgãos) quanto fora do corpo (pele). A tecnologia é usada para avaliar a toxicidade das matérias-primas.
Como a empresa baniu os testes em animais anos antes da criação da nova metodologia, a segurança da matéria-prima antes era avaliada por meio de cálculos de segurança. “Quando a gente não tem dados, a gente considera que essa matéria-prima é crítica. Então, a gente assume um risco que, muitas vezes, é hipotético. E aí você libera essa matéria-prima com uma concentração baixa”, explica Kelen. A amostra permite usar concentrações mais precisas dos ingredientes; nem sempre a concentração mais alta é a melhor.
Outro equipamento do laboratório também permite analisar os efeitos das matérias-primas em moléculas de DNA. “A molécula de colágeno, por exemplo, é muito grande. Então, se você colocá-la num hidratante, ela não vai conseguir entrar na sua pele; a não ser que seja uma molécula hidrolisada, ou seja, quebradinha”, conta Kelen Arroteia. O caminho, então, é usar ativos que estimulem a produção da proteína pelo próprio organismo, como o ucuuba, fruto encontrado na Amazônia. “O ideal é que a sua pele produza mais colágeno, porque ela já vai produzir no formato adequado para a sua funcionalidade”, completa a pesquisadora.
Fonte: Mulher