Mulheres e homens que criam, constroem e transformam realidades e materiais com as próprias mãos. Eles são trabalhadores e estão no eixo central da exposição do fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado que será aberta ao público neste sábado (26), em Brasília. A mostra Trabalhadores inaugura o espaço de exposições temporárias do Museu Sesi Lab, coordenado pelo Serviço Social da Indústria (Sesi), da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
As vivências laborais em diversos segmentos e, também, os árduos processos manuais de produção e os dramas sociais estão retratados em preto e branco, em 150 imagens capturadas por Salgado, em viagens realizadas em seis anos, de 1986 a 1992, em projeto de registros de mão de obra ao redor do planeta.
Com 79 anos, Sebastião Salgado é nascido em Minas Gerais e radicado em Paris desde 1973. Ele explica que essas fotografias são uma espécie de investigação visual da sociedade que foi fruto da Revolução Industrial, período em que o trabalho manual foi centro da vida de diversas pessoas pelo mundo, segundo ele.
No entanto, o fotógrafo entende que houve uma mudança na organização social do trabalho, impulsionada pela intervenção da tecnologia e da informática, com a automatização de maquinários e de processos e, consequentemente, a redução de mão de obra.
“Nesse projeto, quis documentar o fim da primeira grande revolução industrial, na qual o trabalho era extremamente importante. Durante seis anos, viajei pelo mundo em busca da presença da mão humana e na produção. Máquinas inteligentes estavam chegando às linhas de produção. Os computadores e a robotização estavam começando a substituir a força do trabalho” observou Salgado.
Exposição fotográfica
A exposição Trabalhadores contou com a curadoria e design da produtora gráfica Lélia Wanick Salgado, esposa do fotógrafo e parceira dele nos projetos. A mostra fotográfica de Brasília está igualmente estruturada como no livro Trabalhadores, uma Arqueologia na Era Industrial. Lélia também a dividiu em seis capítulos.
Nos corredores da exposição, a pluralidade de imagens ilustra rotinas duras de trabalho na agricultura, nas minas e nas indústrias. Cada foto, com iluminação, ângulo e variações de cinza, preto e branco, revela o mundo do trabalho, sob a ótica de Sebastião Salgado.
No Brasil, particularmente, Sebastião Salgado congelou no tempo uma multidão de garimpeiros de Serra Pelada, na Serra dos Carajás, no Pará, que se amontoavam em escadas de madeira, com carregamentos de até 65 quilos, nas costas. O maior garimpo do país foi oficialmente fechado em 1992 e deixou uma cratera com 80 metros de profundidade e um lago poluído com mercúrio.
Outra atividade do país amplamente documentada por Sebastião Salgado foi a de trabalhadores rurais de plantações de cana-de-açúcar, em tempos do ProÁlcool, programa do governo brasileiro de incentivo à produção de álcool combustível, o etanol, para abastecimento de veículos nacionais.
Além das fronteiras brasileiras, estão retratados, entre outros ofícios, o plantio de tabaco, em Cuba; a colheita de folhas para chá, em Ruanda; a construção de navios, no estaleiro de Gdansk, Polônia; a reciclagem de metais de navios desmantelados, em Bangladesh; a fabricação de carros, na Ucrânia, e de bicicletas, na China; a extração de enxofre por operários intoxicados em um vulcão na ilha de Java, na Indonésia; a exploração de minas de carvão na Índia, por ordem da Inglaterra; o combate a incêndios em poços de petróleo no Kuwait; a pesca de atum na Sicília, na Itália; e a siderurgia na cidade portuária de Dunkerque, na França; e muitas outras atividades, em diversos destinos percorridos pelo Sebastião Salgado.
Para o profissional das câmeras, mais do que uma exposição fotográfica, a mostra é uma homenagem a todos os trabalhadores.
“Eu tinha que prestar homenagem a esse trabalho que estava em meu coração, que era a razão de meu ativismo político e do que acreditava ser o mundo da produção. Realizei esse projeto com imenso prazer e orgulho por fazer parte dessa espécie de construtores, apesar, claro das condições muitas vezes difíceis e desumanas em que o trabalho era realizado. É uma alegria poder voltar a apresentar este trabalho fotográfico no Brasil, e uma honra ser primeiro artista expor na galeria exposições do Museu Sesi Lab, em Brasília” ressaltou Sebastião Salgado.
Contemporaneidade
A exposição que chega a Brasília neste fim de semana já passou por 78 endereços pelo mundo. No Brasil, as primeiras montagens foram simultâneas, em 1994, no Museu de Arte de São Paulo (MASP) e no Museu de Arte Moderna (MAM), no Rio de Janeiro. A Trabalhadores ainda passou por Curitiba (PR) e a última vez que os trabalhos foram apresentados no país foi na sede da Itaipu Binacional, em Foz do Iguaçu (PR), em 2014.
O arquiteto e coordenador-geral da exposição Trabalhadores, Álvaro Razuk, interpreta que a exposição continua atual, mesmo após cerca de 30 anos dos registros fotográficos de Salgado e quase uma década depois de ter sido vista pelo público brasileiro.
“Essas fotos continuam atuais, justamente, porque esse problema não se extinguiu. Existe muito trabalho precarizado, ainda, no mundo. A toda hora, continuamos vendo notícias de trabalho análogo à escravidão, aqui no Brasil, também”, declara o arquiteto.
Para Razuk, os trabalhos das lentes do fotógrafo servem como documentos importantes de pesquisa. “Por um lado, eu espero que essa exposição se desatualize, mas, ao mesmo tempo, a [mostra] Trabalhadores vai ser importante como um relato histórico. Acho que o trabalho do Sebastião tem um pouco da formação dele, no jornalismo, como ele pensa, como ele fala em suas reportagens. Então, eu acho que esse acervo todo vai ter importância de memória e de documentação.”
Educação
O fotógrafo Sebastião Salgado foi convidado a montar Trabalhadores no espaço de exposições temporárias do Museu Sesi Lab, pelo Sesi e pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), ambos da CNI, por oferecer experiências que navegam nos campos da arte, ciência e tecnologia, de acordo com a gerente executiva de Cultura do Sesi, Cláudia Ramalho.
Claudia complementou dizendo que a natureza da exposição está em conexão com O Futuro das Profissões, tema anual do Sesi Lab, em 2023. O espaço está em funcionamento desde novembro de 2022 e foi inspirado no Exploratorium, um museu de ciência, tecnologia e artes em San Francisco, Califórnia, nos Estados Unidos.
Para Claúdia Ramalho, o Sesi Lab é um espaço que tem a missão de educar e atiçar o visitante a refletir acerca de questões sociais e a nova exposição contribui para isso. “Nosso objetivo é trazer essa discussão sobre o mundo do trabalho e, principalmente, relacionado às profissões, à indústria 4.0. Vamos trazer conteúdos para que a população perceba e compreenda a importância do desenvolvimento de competências pessoais, sociais, produtivas, e, sobretudo, para que esses jovens estejam aptos a essas profissões que a gente ainda não sabe que vão existir daqui a dez anos, por exemplo. E qual é a competência mais importante? É a educação e é por isso que a gente aborda a temática de uma forma lúdica.”
O público
A exposição Trabalhadores é destinada ao grande público e foi montada, na capital federal, para ser vista por trabalhadores, estudantes, acadêmicos, e não somente por fotógrafos profissionais e os interessados em fotografia.
Com a experiência, os visitantes poderão compreender a importância do trabalhador e valorizar a necessidade de dignidade e melhores remunerações. As visitas poderão ser guiadas por profissionais que estudaram o enredo de cada imagem exposta.
Na abertura oficial da exposição fotográfica, neste sábado (26), às 15h, será exibido o documentário O Sal da Terra, dirigido pelo alemão Wim Wenders e o brasileiro Juliano Salgado, filho de Sebastião Salgado. O filme é sobre a trajetória deste artista, seus trabalhos premiados e o Instituto Terra, fundado pelo casal Lélia Wanick e Sebastião Salgado, em 1998. O longa de uma hora e 50 minutos de duração concorreu, em 2015, à estatueta do Oscar, na categoria de melhor documentário. Após a exibição da obra, o diretor Juliano Salgado conversará com o público do Museu Sesi Lab.
Novo projeto
Antes da abertura oficial da mostra Trabalhadores, o arquiteto das exposições de Sebastião Salgado, Álvaro Razuk, adiantou que está sendo negociado o retorno ao Brasil da nova exposição fotográfica de Sebastião Salgado no projeto Amazônia, idealizada pela curadora das imagens, Lélia Wanick Salgado.
Segundo Álvaro Razuk, novas edições da exposição Amazônia poderão ser agendadas para 2024 e, possivelmente, para novembro de 2025, durante a realização da 30ª Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém.
A exposição exibirá o resultado de sete anos de expedições fotográficas na Amazônia brasileira. As fotografias foram feitas por terra, água e ar e retratam a transformação da Amazônia, com degradação da floresta e falta de proteção de territórios e povos indígenas.
Em 2022, a exposição já teve edições no Sesc Pompeia, na capital paulista, e no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro.
Exposição Trabalhadores – Serviço
Período: 26 de agosto a 28 de janeiro de 2024.
Endereço: Museu Sesi Lab, Setor Cultural Sul, antigo Touring Club, ao lado da Rodoviária do Plano Piloto;
Horários: de terça a sexta-feira, das 9h às 18h; sábados, domingos e feriados, das 10h às 19h;
Ingressos: bilheteria do Sesi Lab e pela internet;
Valores das entradas: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).
Fonte: EBC GERAL