Histerectomia total: como é o procedimento feito por Preta Gil

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Preta Gil fez histerectomia total junto com cirurgia do câncer
Reprodução/Instagram

Preta Gil fez histerectomia total junto com cirurgia do câncer

A cantora Preta Gil foi submetida a uma cirurgia para retirada de um tumor no intestino e, no mesmo procedimento, fez uma histerectomia total, que é a retirada completa do útero com o colo do útero. Alexandre Pupo, ginecologista e obstetra, médico associado à FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), explica que o útero tem algumas ligações chamadas de aparelho suspensor e de sustentação do útero. São ligamentos que o prendem à parede do abdômen e permitem que ele fique na posição ideal. “Então, precisamos remover esses ligamentos, seccioná-los para podermos retirar o útero de sua posição. Ele tem também uma irrigação através das artérias uterinas que também tem que ser ligadas e, por fim, tem a conexão dele com a vagina. Então, o fundo vaginal tem que ser aberto para que ele seja solto da vagina e então possa ser removido”.

A recomendação da retirada do útero pode acontecer frente a diversas situações. O câncer de colo de útero, o câncer de endométrio e o câncer de ovário e de trompas são algumas delas. Fora isso, miomas de grande volume em pacientes que já tiveram todos os filhos que queriam ter e apresentam quadro de sangramento também pode ser um indicativo, além de miomas de crescimento rápido e exagerado, quando há suspeita de câncer.

Em outras situações, como o comprometimento do útero por adenomiose (doença que é semelhante à endometriose) também pode haver indicação de retirada do útero. E ainda: quando o paciente tem algum tumor em órgãos ao redor que esteja invadindo também a parede uterina, por exemplo, em alguns cânceres de retossigmoide, ou até eventualmente em casos extremos na bixiga. Nesses casos, pode ser necessária a remoção do útero como parte do tratamento.

Por que fazer em uma paciente com câncer de intestino?

Alexandre Pupo explica que a porção final do intestino, que é o reto e o sigmoide, na verdade o sigmoide é a penúltima porção e o reto é a última porção, eles estão próximos, o sigmoide, ao ovário, a trompa do lado esquerdo e a parede uterina posterior esquerda e o reto está em contato próximo com a região mediana da parede uterina posterior, o colo do útero e a vagina, na sua parede posterior vaginal também.

“E aí, obviamente, um tumor crescendo nessa região pode comprometer por contiguidade qualquer uma dessas porções do útero e você não vai conseguir ressecar o tumor sem tirar o útero junto, porque a regra número um da retirada de qualquer câncer é você ressecar esse câncer com uma margem de segurança. Então, se eu ressecar o tumor de uma forma que eu deixe um pedacinho de tumor em qualquer lugar, eu não fiz uma ressecação completa e, dessa feita, obviamente, essas células ou esses pedacinhos de tumor que sobraram vão, em algum momento, voltar a crescer e a gente sabe que o câncer de intestino tem mais dificuldade de responder aos tratamentos adjuvantes ou medicações. Então, a cirurgia acaba sendo um tratamento bastante importante nesse cenário.”

Como fazer a retirada?

O útero, explica o médico, tem um aparelho de suspensão e sustentação que o mantem na posição, e o colo do útero é ‘abraçado’ pelo fundo e se acopla no tubo vaginal. Então, quando se faz a ressecção do útero é mista, é fundamental que você solte o colo do útero dessa porção do fundo vaginal, não tem outra maneira de fazê-lo. E a questão da irrigação, o útero é suprido por duas artérias, uma do lado direito, outra do lado esquerdo e que também tem que ser seccionadas para que possa ser extraído.

Depois que é retirado o útero, o fundo vaginal é estruturado, costurado, e então o tubo vaginal é restituído à sua integridade, sem maiores comprometimentos para paciente do ponto de vista, seja qualidade de vida, questão da sexualidade, nada disso é interferido pela retirada do útero e do colo do útero, quando necessário, obviamente”, explica o médico.

Preta Gil passou por uma cirurgia para retirada de tumor
Reprodução/Instagram – 20.08.2023

Preta Gil passou por uma cirurgia para retirada de tumor

Alexandre Pupo esclarece que cirurgia pode ser realizada por diversas técnicas. A técnica mais tradicional e mais antiga para a remoção do útero é a via vaginal. É uma via que foi já estabelecida séculos atrás com uma baixa morbidade e baixo risco para a paciente, desde que em situações normais. É um procedimento rápido e por ser apenas uma sutura do fundo vaginal, porque todo procedimento é feito através do tubo vaginal, então você tem muito pouca dor e muito pouca complicação pós-operatória relacionada ao procedimento.

“Agora, quando você faz por via abdominal, você tem a técnica tradicional em que é feita uma incisão no abdômen, seja ele longitudinal, do umbigo até a pube, ou seja ele transversal, no caso semelhante a uma cicatriz cesariana. Você promove a retirada do útero, mas depois você tem que suturar essa grande cicatriz no abdômen, o que faz com que seja o procedimento de pior qualidade de pós-operatório. Então a gente tem que manter o paciente com mais analgésico, é mais doloroso, tem o risco maior de infecção e sangramento e você tem ali no final uma cicatriz mais ampla, também com riscos de hérnias incisionais, que são hérnias causadas pelo próprio procedimento cirúrgico, na cicatriz onde foi feita a cirurgia e a necessidade de um repouso por um tempo maior para que essa cicatrização ocorra adequadamente”, avalia o especialista.

Laparoscopia e cirurgia robótica

“Há a técnica também minimamente invasiva, a laparoscopia ou a cirurgia laparoscópica assistida por robô, que seria o que nós chamamos coloquialmente de robótica. A diferença entre a laparoscopia e a robótica é que, na primeira, o cirurgião opera diretamente os instrumentos laparoscópicos e, no segundo, existe uma interface entre o cirurgião e os equipamentos de laparoscopia, que é o robô. Então, o cirurgião senta no console do robô e acopla os braços robóticos às pinças cirúrgicas e ele manipula as pinças através do robô. Ele teria uma vantagem de um pouco mais de precisão no tratamento. Você tem algumas características dessa interface robótica que permitem uma cirurgia de maior delicadeza, mas é necessário dizer que o robô precisa de uma curva de aprendizado adequada”, detalha Pupo.

Não é qualquer cirurgião que pode sair operando um robô, assim como não é qualquer pessoa que pode sair dirigindo um caminhão, um ônibus, sem o devido treinamento. “Tanto a laparoscopia quanto a robótica, a laparoscopia assistida por robô, são cirurgias realizadas por pequenas incisões no abdômen, então não há um grande corte, mas pequenos furos, que podem variar de 3 milímetros nas mini-laparoscopias, até 10, 12 milímetros quando necessário a extração de uma peça cirúrgica, alguma coisa pela própria incisão. E através desses furos, então, é inserida uma câmera para olhar dentro do abdômen, é feita uma distensão do abdômen com gás carbônico, então cria-se internamente uma bolha, porque, diferente do que pensam as pessoas, a cavidade abdominal tem pressão negativa e por conta disso não existe nenhum espaço morto entre órgãos. Então, para você conseguir um espaço para operar, você distende a parede do abdômen com gás carbônico, cria uma bolha lá dentro, a parede abdominal é elástica, flexível, permite essa bolha se acomodar ali dentro, isso permite criar um espaço para que você possa operar e manobrar os seus instrumentos dentro da cavidade abdominal. E aí procede-se ao tratamento cirúrgico, muito semelhante ao que se faz na cirurgia aberta convencional, e depois, a extração do útero, que é um órgão grande, pode ser realizada através do próprio tubo vaginal. Então, como você obrigatoriamente tem que abrir o fundo vaginal para desacoplar o colo do útero da vagina, você aproveita e, como se fosse um parto, você empurra o útero pela própria vagina e o útero é “parido”. E ao final do procedimento, então, a cúpula, o fundo vaginal, é fechado, suturado pela própria técnica da laparoscopia, ou a laparoscopia assistida por robô. A vantagem dessa técnica, por terem pequenos furos no abdômen, a recuperação pós-operatória costuma ser bastante rápida, a cicatrização, por serem áreas menores de cicatriz, ocorre com uma velocidade maior, a dor, o desconforto pós-operatório é menor, o risco de infecção e de sangramento é bem inferior à cirurgia tradicional aberta. E, por conta disso, o paciente retorna mais rápido às suas atividades do dia-a-dia”, detalha o médico.

Tanto a laparoscopia quanto a cirurgia vaginal são mais ou menos semelhantes em termos de recuperação. Mas a cirurgia laparoscópica permite um acesso muito mais amplo à cavidade, uma visão de outras estruturas e outros órgãos que a cirurgia vaginal não permite. Então, acaba que a cirurgia laparoscópica hoje ganha mais espaço que a cirurgia vaginal por ser de um aprendizado mais fácil e apresentar ganhos do ponto de vista de inspeção de cavidade abdominal como um todo e é superior à cirurgia vaginal no quesito de tratamento de aderências e doenças extra-uterinas que às vezes vem junto com a doença do útero.

Quando operar

“O órgão deve ser extraído por conta de um câncer quando ele estiver fazendo parte do processo do câncer ou ser um ponto que rápido e facilmente podem ser acometidos pela doença. Então, pela proximidade, um câncer de ovário ou de trompa pode, com bastante rapidez, apresentar a metastatização para o útero, então, nesse cenário, o útero acaba sendo removido junto. No caso, obviamente, de pacientes com prole constituída, agora, em pacientes que ainda têm desejo reprodutivo e a lesão, o câncer ovariano ou de trompa ainda está no seu estágio mais inicial, pode-se discutir, eventualmente, a preservação do útero para a questão de fertilidade, mas isso são exceções. A regra é que em câncer de ovário e de trompa o útero sai junto”, diz Pupo.

“Obviamente, nos casos de câncer de endométrio não tem como preservar o útero porque o câncer é do próprio útero. Sarcomas, também de útero, necessitam da remoção do próprio útero. Agora, colo de útero também é um câncer que pode eventualmente, em casos de pacientes que têm desejo reprodutivo e o seu tumor é inicial, a preservação do corpo do útero. Então você pode realizar a resecção do colo do útero mantendo o corpo do útero e reacoplando ele à vagina depois da resecção do seu colo. A gente chama esse procedimento de traquelectomia radical. É um procedimento reservado exclusivamente às pacientes com câncer muito inicial e que têm um forte desejo reprodutivo, utilizando, obviamente, seu próprio corpo e seu próprio útero. Existe sempre a possibilidade do útero de substituição e isso, inclusive, é validado por lei no nosso país nesses casos mais graves em que a paciente não pode utilizar seu próprio útero para engravidar. Fora isso, você tem situações como, por exemplo, câncer de reto e o câncer de sigmoide, de colon sigmoide, que, eventualmente, em estágios em que eles já se encontram mais volumosos, você tem um comprometimento por contiguidade da parede uterina e para você, então, conseguir a remoção completa do tumor, acaba que tem que tirar também o útero nesse cenário”.

Em relação ao mioma, o médico explica que é um tumor benigno, que, em teoria, não teria grandes problemas, “mas que nós sabemos que ele acaba apresentando um volume de crescimento rápido em alguns cenários, ele pode apresentar grandes volumes, ele pode apresentar sangramentos exagerados no período menstrual, inclusive levando a paciente a anemias bastante importantes, fora as questões, obviamente, de disrupção da sua qualidade de vida e das suas atividades diárias, e também pode causar dor. Outra coisa, os miomas que abaulam a cavidade endometrial podem comprometer a fertilidade, dificultar que o embrião consiga se instalar e quando se instala aumentando o risco de abortamento. Então é um cenário em que muitas vezes o médico acaba optando pela remoção do mioma, obviamente, porque a gente quer preservar a fertilidade nessa mulher. Agora, quando os miomas são volumosos, numa paciente que já tem a sua prole constituída, ou seja, sem desejo de produtivo. Miomas de crescimento rápido, em que nós suspeitamos que possa estar nascendo ali um câncer. Miomas causando muito desconforto, ou seja, por dor, seja pelo próprio volume comprimindo a bexiga e o intestino, que estão bexiga à frente, intestino atrás do útero. E a questão do sangramento exagerado são também indicações de remoção do útero junto com esses miomas.”

Riscos da cirurgia

Toda cirurgia tem o risco de sangramento e o risco de infecção. O risco de sangramento e infecção são maiores naquelas pacientes que vão fazer a cirurgia pela via aberta, com a grande incisão no abdômen. Em seguida, vem as cirurgias vaginais, porque você tem um espaço muito exíguo, então sangramentos eventualmente acontecem, mas os riscos de infecção já são bastante baixos.

E por fim as cirurgias laparoscópicas e laparoscópicas assistidas por robôs ou robóticas, onde o risco de infecção e sangramento caem bastante pela qualidade de imagem e pelo fato de que não é feita cirurgia de barriga aberta, mas por pequenas incisões que são fechadas pelos equipamentos que nós usamos para manter essas incisões abertas e permitir a passagem das pinças que usamos para operar. Isso posto, obviamente, em toda cirurgia em que nós removemos um órgão, existem algumas questões.

Então, a sutura vaginal, se não bem feita ou se apresentar algum distúrbio metabólico da paciente, como diabetes ou baixa proteína no corpo, ou pacientes muito obesos, onde existe uma pressão intraabdominal muito grande. Em qualquer dessas circunstâncias, eventualmente, você pode ter uma abertura dessa sua sutura da cúpula vaginal.

“Então, esse é um risco que existe na cirurgia. Outro risco, a cirurgia, na histerectomia total, a gente tem que desacoplar um pouquinho a cúpula da bexiga da porção anterior do colo do útero, onde a gente vai ter que depois seccionar para soltá-lo da vagina. E nessa localidade, às vezes, você tem, por questão de cicatrizes, cesárias múltiplas, endometriose, aderências por qualquer outra causa, o maior risco eventual de abrir, na hora de soltar, abrir um pouquinho o fundo da bexiga e precisar de uma sutura. Outro risco que existe é em relação à porção posterior, o intestino, e se houver muita doença aderindo o intestino ao útero, como por exemplo o caso de endometriose no seto vetrovaginal, ou endometriose envolvendo o ovário, os ligamentos que prendem o útero ao osso do sacro”, diz Pupo.

Todas essas situações que levam à formação de aderências entre o útero e o intestino podem, na hora do processo de soltar um órgão do outro, levar a uma lesão, uma perfuração do intestino, que precisa ser prontamente reconhecida pela cirurgião e tratada para evitar complicações maiores relacionadas a isso. “Outra questão são os uretéres, que são os caninhos que ligam o rim à bexiga e levam um xixi filtrado pelo rim até a bexiga e que passam próximos à região do colo uterino, a mais ou menos dois centímetros, um centímetro e meio lateral a eles e que, também, em situações de maior dificuldade técnica na cirurgia, por questões, de novo, de aderências, de alterações do colo do útero, por exemplo, no caso de cirurgias prévias do colo do útero, por HPV, por câncer de colo ou por lesões premalignas do colo do útero, endometriose, cirurgias anteriores já realizadas, você pode, no processo de soltar o útero, dos paramétrios, que são os ligamentos que prendem o útero à asa do ilíaco, à asa da bacia, você pode ali, eventualmente, provocar alguma alteração no ureter e isso, eventualmente, causar dificuldade para a drenagem da urina naquele lado. Isso também tem que ser identificado, caso aconteça, para ser tratado adequadamente. A depender da situação, diversas técnicas podem ser utilizadas. Mas, em relação a complicações maiores, como risco de morte etc., isso é bastante baixo”.

É importante ressaltar a importância de se controlar, de se prevenir a trombose, que qualquer cirurgia de maior porte, que você remova o órgão, tenha mais tempo de duração ou que, eventualmente, o médico trabalhe próximo a grandes vasos, como no caso da histerectomia, que se trabalha perto da artéria e da veia ilíaca, que levam e trazem o sangue da perna para o coração, há um risco maior de trombose, e isso deve ser visto de perto no infraoperatório, pré e pós-operatório, com utilização de métodos e mecanismos para diminuir esse risco de trombose.

“Esses são os maiores riscos e, de todos eles, a trombose no ambiente em que a cirurgia é feita por um cirurgião experiente, num hospital de qualidade, com equipamentos adequados, a trombose, via de regra, nessas cirurgias, acaba sendo o fator de maior risco em relação a morte, porque a trombose pode levar a um tromboembolismo pulmonar e esse sim é uma situação de alto risco de morte.”

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Fonte: Mulher

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