A licença menstrual é um termo que tem sido usado para se referir a uma licença médica concedida a mulheres que sofrem de sintomas graves durante seu ciclo menstrual, como cólicas intensas, dores de cabeça e fadiga extrema. No entanto, essa licença não é oficialmente reconhecida em muitos países e não existe uma lei ou política que a regule.
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De acordo com Andrea Peres, advogada especialista em Direito das Mulheres e Direito das Famílias e Sucessões e Ouvidora-Adjunta da Mulher da OAB Seccional do Rio de Janeiro, algumas empresas e empregadores podem oferecer licenças médicas para funcionárias que sofrem com sintomas menstruais graves, mas isso pode variar de acordo com a política da empresa e a legislação do país em que a empresa está localizada.
“A Espanha foi o primeiro país europeu a aprovar a licença menstrual. Japão, Indonésia, Taiwan, Coreia do Sul e Zâmbia já adotaram. A lei foi aprovada no parlamento em 16 de fevereiro de 2023. Essa lei inaugura uma visão mais ampliada sobre os direitos sexuais e reprodutivos”, explica.
Segundo a advogada essa é uma lei bastante polêmica, pois traz à tona opiniões divergentes acerca da produtividade feminina, todavia também traz a oportunidade para o debate sobre as dores incapacitantes da menstruação.
Peres explica que esse dispositivo legislativo é de suma relevância para que a normalização do trabalho com dor e o estigma em torno da menstruação deixem de ser práticas sociais: uma desconstrução dessa cultura que tem raízes no machismo e nos tabus que envolvem o corpo feminino.
“No Brasil, atualmente não existe uma lei específica que estabeleça a “licença menstrual”. Apesar de existirem leis, como por exemplo a Constituição Federal que garante a proteção à saúde como um direito fundamental de todos os cidadãos combinada com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que prevê a concessão de licença médica para trabalhadores que sofrem de doenças ou acidentes que os impeçam de trabalhar. Tais diplomas legais não oferecem proteção e apoio para mulheres que sofrem de sintomas menstruais graves”, diz.
Nesse sentido, segundo Andrea se uma trabalhadora estiver sofrendo de sintomas menstruais graves que a impeçam de trabalhar, ela pode solicitar uma licença médica e ter direito a afastamento remunerado por um determinado período, conforme avaliação médica.
“A polêmica que é levantada acerca do tema diz respeito ao argumento de já existir o direito à licença médica para toda pessoa que sofre com alguma doença. Essa discussão acaba por suscitar questionamentos acerca das consequências da rotulação dessa enfermidade: se a partir do reconhecimento específico desse direito, a desigualdade de gênero aumentaria invés de diminuir”, diz.
Na Espanha, a licença menstrual é uma política pública custeada pelo Estado, enquanto as outras licenças médicas, genéricas, são pagas pelas empresas. É importante levar em consideração que a dismenorreia é a dor, principal sintoma de que tem a síndrome menstrual intensa.
“Trata-se de uma garantia importante para que as trabalhadoras não trabalhem quando enfrentarem dificuldades menstruais. Não podemos olvidar que esta questão toca o acesso à saúde integral da mulher, para que elas recebam um melhor diagnóstico e acompanhamento médico. Quando afirmamos que a legislação brasileira já garante o afastamento em virtude das dores provocadas pelo processo menstrual, negamos o reconhecimento da menstruação como um processo fisiológico que deve gerar direitos. Além disso incentivamos a cultura da medicalização da menstruação, como se esse processo fosse uma doença”, diz.
Discriminação
Para a advogada, o estigma ou discriminação que podem advir de tal política afirmativa menstrual se baseiam nas crenças e atitudes sexistas que contribuem para o estigma menstrual e a perpetuação dos estereótipos de gênero que impactam negativamente na diferença salarial entre gêneros.
“A normalização dessa conduta social, ainda é pior porque corrobora para a manutenção das táticas que nos mantêm no conformismo. Os estereótipos negativos de gênero, quais sejam, fragilidade feminina, improdutividade e falta de confiabilidade retratam a menstruação de forma negativa, como uma doença que precisa ser corrigida”, diz.
Para Andrea, há ainda muitos obstáculos a serem enfrentados no Brasil na luta pelo reconhecimento do direito das mulheres. Contudo, países como os EUA encontrariam muito mais dificuldade pois em seu arcabouço legislativo, poucas, são as licenças remuneradas que visam reduzir a desigualdade de gênero na sociedade.
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“Apesar de ser memorável a proposta legislativa na Espanha, quando se trata da dor proveniente da menstruação, três dias podem não resolver o problema. Assim sendo, é importante que haja uma mudança cultural do ambiente de trabalho, na qual a flexibilidade, a possibilidade de trabalhar em casa e horários de trabalho personalizado sejam providenciais”, explica.
Para Andrea, existem empresas que adotam esforços para desenvolver essa cultura empresarial de não estigmatizar a licença menstrual. Acredita-se que a menstruação é uma função biológica e não há razão para sentir-se desconfortável com essa dor no trabalho e há aquelas que acreditam que a licença menstrual pode gerar queda na produtividade.
“Todavia essas empresas estão equivocadas, visto que ao trabalhar com dor, a produtividade e foco das trabalhadoras caem drasticamente. Existem empresas que adotaram a licença menstrual como uma prática no ambiente de trabalho, como consequência obtiveram aumento da produtividade. Tal resultado se evidencia por permitir o descanso à trabalhadora num momento em que seu corpo necessita, então ao retornar (a cessar do período menstrual) seu foco e energia propiciarão mais produtividade. O reconhecimento de suas necessidades gerará um autorreferencial positivo e validará o comprometimento do grupo em relação a consolidação de uma ética laboral com foco na trabalhadora”, afirma.
Para Andrea, se há dificuldades para se trabalhar devido a sintomas menstruais graves, é recomendável conversar com o médico e com o departamento de recursos humanos da empresa para ver quais opções estão disponíveis.
Fonte: Mulher